A SOCIEDADE BRASILEIRA
HOJE: BREVES CONSIDERAÇÕES
COM O MOVIMENTO DA REFORMA SANITÁRIA BRASILEIRA
Nas quatro contribuições anteriores abordamos o
engendramento do embuste do atual ajuste fiscal onde ficaram delineados os
segmentos ou classes que são os “perdedores reais”: a grande maioria.
Consideramos agora que grande parte dessa maioria mostra-se passiva e/ou
conivente devido á desinformação/despolitização sobre o que realmente acontece,
ou com informação deformada pela mídia globalizada. Por isso comentaremos
alguns aspectos da militância no MRSB e no SUS, referentes ao direcionamento e
ampliação da sua comunicação social e alianças.
Além do setor saúde com suas instituições e entidades, há igualmente
os demais setores como a previdência/assistência social, educação, trabalho,
transporte, meio ambiente, habitação e outros, pelos seus lados público e privado(consumidores
e produtores de bens e serviços) e dos excluídos. Todos envolvidos e oprimidos pelo
Ajuste Fiscal imposto e com suas lutas limitadas setorialmente.Temos as
centrais sindicais, as entidades dos moradores, dos aposentados, dos
professores, dos prefeitos municipais, dos autônomos, dos micros, minis, médios
e grandes empresários e outras como a importante ANFIP-Associação dos Auditores
Fiscais da Receita Federal. Como construir lutas comuns, por isso fortalecidas,
e como consequência avançar nas próprias lutas setoriais? No setor saúde temos
os conselhos de saúde nas três esferas, todos com as entidades representativas
dos usuários, trabalhadores de saúde, prestadores dos serviços e governo, temos
os conselhos nacionais dos secretários estaduais e municipais de saúde, estes
últimos também em conselhos estaduais, temos as comissões de saúde nas Câmaras
Municipais e Estaduais e no Congresso Nacional que também sedia a Frente
Parlamentar da Saúde, temos a ABRAHUE e entidades nacionais de hospitais
privados, e também os Conselhos Éticos dos profissionais de saúde, associações
e sindicatos ao nível nacional e estadual.
As entidades ligadas ao MRSB e a militância “SUS”(COSEMS,
CONASEMS, CMS, CES, CONASS, CNS, FIOCruz, outros) dispõem de variados métodos
de comunicação social: revistas, boletins, boletins eletrônicos, sites, acesso
ás redes sociais, etc. Seria oportuna uma articulação entre essas entidades(uma
a uma e no conjunto) objetivando abordagem melhor elaborada e diferenciada para as malas de endereços
postais e eletrônicos de todas as entidades: do setor saúde e demais setores
acima mencionadas. Quais são nossos
papéis e responsabilidades nesse intercambio e articulação política de
ampliação e fortalecimento? Quais as expectativas e como se distribuem e se
movem hoje os diversos segmentos e classes na sociedade? Partindo da
segmentação da sociedade na utilização dos serviços de saúde, vemos que nos 70-75%
da população que depende só do SUS, estão os desempregados, os sub-empregados,
os trabalhadores pobres(formais e informais), os pequenos autônomos e parte dos micro e mini
empresários urbanos e rurais. Na classificação do PNAD/2013 seriam os
miseráveis, a massa trabalhadora e a minoria da classe média baixa. Já nos
25-30% da população que consomem planos privados(dos mais baratos aos mais
caros)e complementam no SUS inclusive por meio de ações judiciais, estão os
trabalhadores formais menos pobres(celetistas privados e públicos e servidores
públicos, todos com planos privados subsidiados), os autônomos médios e
grandes, parte dos micro e mini empresários e os médios e grandes empresários, também todos com planos
privados subsidiados. Na classificação PNAD/2013 seriam a maioria da classe
média baixa e as classes média media e media alta/elite.
Encaixamos aqui duas citações que podem suscitar reflexões
sobre a dinâmica da nossa sociedade. Alvaro G. Linera referindo-se á extração
de mais-valia na complexidade da sociedade moderna, aponta uma “proletarização
difusa” entre assalariados dos setores privado e público, a massa de autônomos,
micro e mini empresários, incluindo professores, pesquisadores, analistas,
cientistas e outros. Oded Grajew refere recente pesquisa do Inst. Ethos, onde
1% das empresas estão realmente implicadas no financiamento das campanhas
políticas(predominando as de maior porte), e um grande campo de RESERVA
potencial para um projeto de nação: milhões de empresas não envolvidas em
investigações do tipo Lava-Jato, nem em financiamento de campanhas, assim como
centenas de sindicatos que não são massa de manobra governista ou legislativa
ou partidária, assim como milhares de políticos não metidos em falcatruas tanto
parlamentares como nos governos.
Pensamos que a atual complexidade da sociedade brasileira
exige reflexões sobe os movimentos de rua a partir de 2013. Em junho daquele
ano predominaram amplamente jovens de várias camadas sociais, não ou muito
pouco partidarizados, sob as bandeiras dos direitos ao transporte coletivo,
saúde, educação e segurança pública. Nos acirrados debates eleitorais e
manifestações de 2014, as pesquisas de opinião revelavam grande coincidência
entre os eleitorados das principais candidaturas em disputa(também entre os que
anularam o voto), em relação ás políticas de emprego, salário mínimo, saúde,
educação e segurança pública. Aparentemente a sociedade, mesmo dividida
eleitoralmente e partidariamente, manteve-se unitária em torno de pleitos
básicos, o que pode ser interpretado como eloquente recado aos seus “representantes” nos partidos, governo e legislativo.
Testemunhamos que tanto a oposição como a situação naquela conjuntura optaram
pelo acirramento da guerra da marketagem de desconstrução da imagem pessoal dos
adversários, e cremos que o recado da sociedade perdeu outra vez grande
oportunidade de evoluir para amplo e democrático debate em torno de um projeto
de nação, ao contrário de meros projetos de poder. Talvez esse
grande desencontro tenha contribuído para que em 2015 as ruas venham
sendo tomadas por segmentos da polarização oposição x situação: direita
explícita/aparelhamento do sentimento anti-corrupção x situacionismo
amorfo/lideranças anti-golpistas . Predominando largamente nos dois polos dos
movimentos, adultos, nível superior e renda alta.
É nessa conjuntura que vemos o desafio da construção da
militância no MRSB e no SUS.
* Nelson Rodrigues dos Santos é graduado em Medicina pela Universidade de São Paulo (1961) e Doutorado em Medicina (Medicina Preventiva) pela Universidade de São Paulo (1967). Especialização em Saúde Pública (Faculdade de Saúde Pública da USP). Foi Professor Titular de Saúde Coletiva na Universidade Estadual de Londrina, Consultor da OPAS/OMS, Professor de Medicina Preventiva e Social da Unicamp,Membro titular de 36 bancas examinadoras de Teses de Doutorado,de22 de Mestrado e de 26 concursos públicos. Publicou 66 artigos e capítulos em revistas e livros nacionais. Assumiu funções de direção no Sistema Público de Saúde, nos níveis municipal, estadual e nacional. Atualmente é Professor colaborador da Universidade Estadual de Campinas e presidente do Instituto de Direito Sanitário Aplicado ( IDISA), atuando principalmente nas seguintes áreas: Desenvolvimento do Sus, do controle social e das Políticas Públicas na área social.

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