‘Retirar o ACS das Equipes de Saúde da Família é um retrocesso no modelo
de Atenção Básica e na democratização do SUS’
Os poucos direitos arduamente conquistados pelos Agentes Comunitários de
Saúde (ACS) nos últimos anos correm o risco de retroceder com a publicação da
Portaria 958/2016, publicada no dia 11 de maio, que determina a substituição
dos ACS por auxiliares ou técnicos de enfermagem. Nessa entrevista, Mariana
Lima Nogueira, professora-pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio (EPSJV/Fiocruz) e integrante da equipe de coordenação do Curso Técnico
de Agente Comunitário de Saúde (CTACS) da EPSJV, explica por que essa proposta
é ancorada em uma série de mecanismos que visam aumentar a precarização do
Sistema Único de Saúde (SUS) e do trabalhador, além de ser um grave retrocesso
para a democratização do SUS e para mudança do modelo de Atenção Básica. A
crítica a essa mudança teve destaque, inclusive, na paralisação nacional que e
Confederação Nacional dos ACS (Conacs) e diversos sindicatos organizaram no dia
18 de maio. Alunos do CTACS da Escola Politécnica também participaram de um ato
no Centro do Rio de Janeiro em defesa dos direitos dos ACS. No mesmo dia 18 de
maio, a Conacs divulgou uma nota com os encaminhamentos propostos pela Confederação,
entre eles a suspensão temporária da portaria para discussão e esclarecimentos
sobre seus efeitos.
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz
| 19/05/2016 14h17 - Atualizado em 25/05/2016 16h31

No meu entendimento, a Portaria 958/2016 é um retrocesso no que se refere à
desprecarização do trabalho na Atenção Básica em diferentes aspectos. Os ACS
são trabalhadores que fazem parte historicamente da chamada equipe mínima, ao
lado da enfermeira, do médico e do técnico/auxiliar de Enfermagem, porém a
partir da portaria 958/2016, os novos ACS poderão ser contratados de maneira
complementar, não se exigindo a presença obrigatória destes na equipe mínima.
Essa medida vai na contramão de um dos principais argumentos e fundamentos da
política da Estratégia de Saúde da Família (ESF), que é ser uma nova proposta
de modelo de atenção, que supostamente, não se apoiaria no modelo biomédico e
hospitalocêntrico, mas na medicina comunitária, no território, nas práticas de
promoção da saúde e prevenção das doenças, reforçando os princípios da
integralidade e da participação social, a partir dos vínculos estabelecidos
entre trabalhadores da saúde e usuários do SUS. O ACS, segundo argumentos
presentes em diversos documentos que apoiaram a construção da política, seria
um trabalhador potente para este trabalho, uma vez que mora no território,
vivencia as mesmas condições da população que procura o serviço e, se
qualificado, a partir da educação popular, poderia fortalecer práticas de
democratização no SUS. Por democratização do SUS entendo que a atuação do ACS
ancorada na sua origem de classe, pode potencialmente contribuir para o
fortalecimento das práticas no SUS que tenham como base o saber popular e a
história dos territórios. Assim como, podem fortalecer a organização da classe
trabalhadora, principalmente da fração de classe proletária que mora nas
periferias, para participarem e tensionarem a política de saúde e os serviços
de saúde de acordo com as suas necessidades e interesses.
A Saúde da Família, assim como o próprio lugar do ACS em uma política pública de um país capitalista dependente é constituída por muitas contradições. Pensando nesta política, podemos afirmar que ainda é centrada na prática do médico e do enfermeiro, vem sendo induzida a prática de mais procedimentos curativos a partir dos novos modelos de gestão e sistemas de avaliação produtivistas fomentados pelo Ministério da Saúde e pelas gestões locais que coadunam com o avanço do neoliberalismo na saúde. A proposta da portaria de redução de carga horária dos ACS com os técnicos de enfermagem e de substituição do ACS pelo auxiliar ou técnico de enfermagem na equipe mínima da ESF reforça o modelo médico-hegemônico e técnico-burocrático na Atenção Básica. Exatamente na contramão do que defendemos em relação à transformação do modelo de atenção que almeja ter como base a participação popular e a educação popular como fundamentos de práticas que tensionariam a hierarquia do saber biomédicos e das práticas de saúde meramente curativas.
A Saúde da Família, assim como o próprio lugar do ACS em uma política pública de um país capitalista dependente é constituída por muitas contradições. Pensando nesta política, podemos afirmar que ainda é centrada na prática do médico e do enfermeiro, vem sendo induzida a prática de mais procedimentos curativos a partir dos novos modelos de gestão e sistemas de avaliação produtivistas fomentados pelo Ministério da Saúde e pelas gestões locais que coadunam com o avanço do neoliberalismo na saúde. A proposta da portaria de redução de carga horária dos ACS com os técnicos de enfermagem e de substituição do ACS pelo auxiliar ou técnico de enfermagem na equipe mínima da ESF reforça o modelo médico-hegemônico e técnico-burocrático na Atenção Básica. Exatamente na contramão do que defendemos em relação à transformação do modelo de atenção que almeja ter como base a participação popular e a educação popular como fundamentos de práticas que tensionariam a hierarquia do saber biomédicos e das práticas de saúde meramente curativas.
Que interesses você identifica por trás dessa portaria?
Percebo que a publicação da Portaria 958/2016 se dá em uma conjuntura
marcada pela importante atuação do movimento dos ACS na exigência de melhores
condições de trabalho, principalmente, de reajuste do piso salarial nacional e
de garantia do recebimento da insalubridade, que nem todos os ACS recebem.
Neste cenário, encontram-se principalmente as forças políticas do Conasems
[Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde], Cofen [Conselho Federal
de Enfermagem), Conacs [Confederação Nacional dos Agentes Comunitários de
Saúde] e Fenasce [Federação Nacional dos Agentes Comunitários de Saúde e
Agentes de Endemia].
Pensemos: por que o Ministério da saúde propõe a substituição de ACS justamente por técnicos de enfermagem? E por que a equipe mínima poderá ser composta sem ACS, ou técnicos, mas com auxiliares de enfermagem? Quais são as forças sociais e políticas envolvidas nessa questão? Claro que para começar a pensar sobre isso é fundamental o exercício de retomarmos a história de alguns processos. A história nos ensina que, dependendo de quem a conta, torna-se possível compreender melhor a complexidade das mediações e das contradições que constituem o presente.
Dialeticamente, é importante registrar que para a gestão pública e com base em um projeto capitalista de sociedade, o ACS também foi incluído na política pública devido ao seu lugar de pertencimento e vínculo no território que o permite muitas vezes atuar como "anteparo" das questões do território entre a população e o Estado, além de ser uma mão de obra que não custaria tanto aos cofres públicos, e que faria a diferença em relação à morbimortalidade materna e infantil. Porém, com o avançar das lutas pelo piso salarial nacional, reajuste do piso e demais exigências que a categoria tem feito, o ACS não se apresenta mais como alternativa “mais barata” para a gestão municipal. Então, o Conasems, sob o argumento de falta de recurso, que não é factível, uma vez que o Ministério da Saúde contribui junto aos municípios com importante parte do financiamento da contratação dos ACS, recorre à alternativa de substituir na equipe mínima da ESF um precarizado por outro, o auxiliar de enfermagem. Este último é precarizado sim, por ter somente o nível de escolaridade fundamental e não ter qualquer perspectiva de formação para a atenção básica à saúde. O trabalhador técnico de enfermagem também tem suas bases de formação no modelo biomédico e hospitalocêntrico.
Pensemos: por que o Ministério da saúde propõe a substituição de ACS justamente por técnicos de enfermagem? E por que a equipe mínima poderá ser composta sem ACS, ou técnicos, mas com auxiliares de enfermagem? Quais são as forças sociais e políticas envolvidas nessa questão? Claro que para começar a pensar sobre isso é fundamental o exercício de retomarmos a história de alguns processos. A história nos ensina que, dependendo de quem a conta, torna-se possível compreender melhor a complexidade das mediações e das contradições que constituem o presente.
Dialeticamente, é importante registrar que para a gestão pública e com base em um projeto capitalista de sociedade, o ACS também foi incluído na política pública devido ao seu lugar de pertencimento e vínculo no território que o permite muitas vezes atuar como "anteparo" das questões do território entre a população e o Estado, além de ser uma mão de obra que não custaria tanto aos cofres públicos, e que faria a diferença em relação à morbimortalidade materna e infantil. Porém, com o avançar das lutas pelo piso salarial nacional, reajuste do piso e demais exigências que a categoria tem feito, o ACS não se apresenta mais como alternativa “mais barata” para a gestão municipal. Então, o Conasems, sob o argumento de falta de recurso, que não é factível, uma vez que o Ministério da Saúde contribui junto aos municípios com importante parte do financiamento da contratação dos ACS, recorre à alternativa de substituir na equipe mínima da ESF um precarizado por outro, o auxiliar de enfermagem. Este último é precarizado sim, por ter somente o nível de escolaridade fundamental e não ter qualquer perspectiva de formação para a atenção básica à saúde. O trabalhador técnico de enfermagem também tem suas bases de formação no modelo biomédico e hospitalocêntrico.
Que lutas históricas são essas em que os ACS estão envolvidos?
Desde meados da década de 1980 e nos anos 1990, ainda sob o calor do
movimento da reforma sanitária e da redemocratização do país, foi hegemônica a
crítica sobre a falta de qualificação, entendida como falta de formação, de
condições de trabalho e de direitos associados ao trabalho, além da crítica
sobre a fragmentação do trabalho das diferentes categorias profissionais de uma
mesma área na saúde, principalmente em relação aos auxiliares de enfermagem.
Compreendeu-se que para atuar na área da saúde, devido à complexidade deste
trabalho, é necessário investir na formação do trabalhador, tanto na formação
específica, com curso técnico, quanto na formação geral, com a oferta do ensino
médio para os trabalhadores que possuíam somente a escolaridade do nível
fundamental, que foi o caso dos auxiliares de enfermagem. O Ministério da
Saúde, junto às Escolas Técnicas do SUS, investiu naquele período na
complementação da formação de auxiliares de enfermagem em técnicos de enfermagem
através do Profae [Projeto de Formação dos Trabalhadores da Área de
Enfermagem]. Ainda na década de 1990, ocorreu a criação do Programa Nacional
dos Agentes Comunitários de Saúde, que depois passou a ser nomeado de Programa
de Agentes Comunitários de Saúde e Programa de Saúde da Família (PSF), onde se
reconhece no Ministério da Saúde, a partir da luta e organização dos ACS
através dos Movimentos de Educação Popular em Saúde, a importante atuação dos
agentes de saúde vinculados às pastorais da Igreja Católica e da Unicef à
Frente do programa Mulheres contra a Seca, no Ceará, na redução da
morbimortalidade infantil. A resolutividade, ou seja, a redução da
morbimortalidade materno-infantil onde havia agentes de saúde trabalhando foi
determinante para a criação de um programa nacional. Os agentes de saúde no
início dos anos 1990 passaram a ser reconhecidos como trabalhadores integrantes
de uma política pública e permanecem na sua luta por direitos. Desde essa
época, o Cofen [Conselho Federal de Enfermagem] já disputava as atribuições dos
ACS, o controle sobre a prática e a formação desses trabalhadores.
Após quase 13 anos de existência de ACS no ESF [a partir de 1997, o PSF torna-se Estratégia de Saúde da Família – ESF] e de muito debate sobre a importância da qualificação destes trabalhadores, entendeu-se a necessidade da formação técnica do ACS. Em 2004, fruto das discussões da recém-criada SGTES [Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde], ficou a cargo das Escolas Técnicas do SUS executar a formação. Assim, a gestão federal financiaria o primeiro módulo do curso [carga horária mínima de 400 horas] e as gestões municipais financiariam a segunda e a terceira etapa da formação [mínimo de 800 horas]. Passados 12 anos da publicação do referencial curricular do curso técnico de ACS, poucos municípios realizaram a formação completa, ofertando somente a primeira etapa que não confere o título de técnico para o ACS. Com o passar dos anos, também houve um importante aumento das atribuições destes trabalhadores na ESF, assim como, a partir da atuação dos seus movimentos sociais organizados, ocorreram algumas conquistas em relação ao reconhecimento profissional, como a lei de criação da profissão e o piso salarial, entre outras. Em todos esses processos, se fez presente uma força que tensionava os avanços da categoria: o Conasems, que sob o argumento de contenção de recurso, se coloca constantemente contra a desprecarização desse trabalhador. Alguns poucos municípios que realizaram a formação técnica dos ACS se depararam com os trabalhadores organizados exigindo melhores salários, pois se tornaram técnicos!
A grande maioria dos 300 mil ACS não tem nenhuma formação específica para o trabalho, sendo formados em cursinhos básicos, aligeirados e voltados às demandas curativas que são priorizadas e exigidas nos sistemas de informação. Ainda há entre os ACS inúmeros vínculos empregatícios:CLT, vínculo direto com os municípios, concurso público, CLT via Organizações Sociais, ONGs, cargos de confiança, contratos temporários, etc... O ACS é um trabalhador que tem sua história marcada pela precarização, tanto em relação às suas condições de vida, pois faz parte de uma fração da classe trabalhadora que luta para sobreviver todos os dias, quanto em relação às políticas de formação e de trabalho.
Outra importante argumento que também aponta para o retrocesso da portaria no que se refere à desprecarizaçao do trabalho, relaciona-se à forma de contratação dos trabalhadores ACS e técnicos de enfermagem. De acordo com a Lei 11.350/2006, o exercício das atividades do ACS deve ser por meio de vínculo direto entre os agentes e os órgãos ou entidades da administração direta, autárquica ou fundacional. Assim, cabe à gestão publica a contratação desses trabalhadores, não sendo permitido por lei, mesmo que ainda existam, formas de contratação indireta, como Organizações Sociais e ONGs. A luta dos ACS pela efetivação é justamente esta, a reivindicação pela contratação direta junto aos gestores municipais. Já os técnicos de enfermagem não possuem qualquer respaldo legal que sustente esse tipo de contratação, ou seja, torna-se mais flexível a forma de contratação desse trabalhador, reforçando a precarização do trabalho e mais uma possibilidade que a portaria coloca para atuação das formas indiretas de contratação mediadas pela gestão privada na política pública.
Após quase 13 anos de existência de ACS no ESF [a partir de 1997, o PSF torna-se Estratégia de Saúde da Família – ESF] e de muito debate sobre a importância da qualificação destes trabalhadores, entendeu-se a necessidade da formação técnica do ACS. Em 2004, fruto das discussões da recém-criada SGTES [Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde], ficou a cargo das Escolas Técnicas do SUS executar a formação. Assim, a gestão federal financiaria o primeiro módulo do curso [carga horária mínima de 400 horas] e as gestões municipais financiariam a segunda e a terceira etapa da formação [mínimo de 800 horas]. Passados 12 anos da publicação do referencial curricular do curso técnico de ACS, poucos municípios realizaram a formação completa, ofertando somente a primeira etapa que não confere o título de técnico para o ACS. Com o passar dos anos, também houve um importante aumento das atribuições destes trabalhadores na ESF, assim como, a partir da atuação dos seus movimentos sociais organizados, ocorreram algumas conquistas em relação ao reconhecimento profissional, como a lei de criação da profissão e o piso salarial, entre outras. Em todos esses processos, se fez presente uma força que tensionava os avanços da categoria: o Conasems, que sob o argumento de contenção de recurso, se coloca constantemente contra a desprecarização desse trabalhador. Alguns poucos municípios que realizaram a formação técnica dos ACS se depararam com os trabalhadores organizados exigindo melhores salários, pois se tornaram técnicos!
A grande maioria dos 300 mil ACS não tem nenhuma formação específica para o trabalho, sendo formados em cursinhos básicos, aligeirados e voltados às demandas curativas que são priorizadas e exigidas nos sistemas de informação. Ainda há entre os ACS inúmeros vínculos empregatícios:CLT, vínculo direto com os municípios, concurso público, CLT via Organizações Sociais, ONGs, cargos de confiança, contratos temporários, etc... O ACS é um trabalhador que tem sua história marcada pela precarização, tanto em relação às suas condições de vida, pois faz parte de uma fração da classe trabalhadora que luta para sobreviver todos os dias, quanto em relação às políticas de formação e de trabalho.
Outra importante argumento que também aponta para o retrocesso da portaria no que se refere à desprecarizaçao do trabalho, relaciona-se à forma de contratação dos trabalhadores ACS e técnicos de enfermagem. De acordo com a Lei 11.350/2006, o exercício das atividades do ACS deve ser por meio de vínculo direto entre os agentes e os órgãos ou entidades da administração direta, autárquica ou fundacional. Assim, cabe à gestão publica a contratação desses trabalhadores, não sendo permitido por lei, mesmo que ainda existam, formas de contratação indireta, como Organizações Sociais e ONGs. A luta dos ACS pela efetivação é justamente esta, a reivindicação pela contratação direta junto aos gestores municipais. Já os técnicos de enfermagem não possuem qualquer respaldo legal que sustente esse tipo de contratação, ou seja, torna-se mais flexível a forma de contratação desse trabalhador, reforçando a precarização do trabalho e mais uma possibilidade que a portaria coloca para atuação das formas indiretas de contratação mediadas pela gestão privada na política pública.
Quais os prejuízos que a retirada do ACS da Estratégia Saúde da Família
podem trazer para o SUS?
A Atuação do ACS, justamente por não ter uma base histórica de formação
profissional biomédica, mas centrar-se no saber popular, e ter como objetivo a
promoção da saúde a partir da participação popular, é potente para a ampliação
do entendimento de saúde enquanto algo que não é restrito ao setor saúde, que é
direito social e que é constituída por determinantes sociais. Estes
determinantes, no âmbito da política pública, localizam-se em diferentes
setores, e assim, a atuação do ACS fortalece a intersetorialidade, princípio
organizativo do SUS. Retirá-lo da equipe mínima da ESF significa enfatizar uma
concepção de saúde restrita e uma atenção básica também restrita, que passará a
ter nos procedimentos curativos e no setor saúde o principal mote,
enfraquecendo a possibilidade de tensionamento dos interesses da população
sobre a política de saúde e com os demais setores que determinam a saúde, como
trabalho, educação e habitação, entre outros.
A substituição do ACS pelo auxiliar de enfermagem na equipe mínima e a contratação de técnicos de enfermagem em substituição ao ACS de forma complementar às equipes de Saúde da Família apontam, inclusive, para uma certa desresponsabilização, ou transferência de responsabilidade da gestão municipal, ou seja, da esfera pública, para a iniciativa privada no processo de formação dos trabalhadores que possuem o nível de escolaridade fundamental. O auxiliar e o técnico de enfermagem são formados majoritariamente por uma rede privada de educação e existem inúmeros cursos de enfermagem particulares. Acredito que esta iniciativa também incide no mercado dos cursos de formação em saúde. Seria importante investigar a participação do sistema S nessa discussão.
A substituição do ACS pelo auxiliar de enfermagem na equipe mínima e a contratação de técnicos de enfermagem em substituição ao ACS de forma complementar às equipes de Saúde da Família apontam, inclusive, para uma certa desresponsabilização, ou transferência de responsabilidade da gestão municipal, ou seja, da esfera pública, para a iniciativa privada no processo de formação dos trabalhadores que possuem o nível de escolaridade fundamental. O auxiliar e o técnico de enfermagem são formados majoritariamente por uma rede privada de educação e existem inúmeros cursos de enfermagem particulares. Acredito que esta iniciativa também incide no mercado dos cursos de formação em saúde. Seria importante investigar a participação do sistema S nessa discussão.
O argumento de ampliação da resolutividade da Atenção Básica, usado na
portaria para justificar a troca do ACS pelo técnico de enfermagem, faz algum
sentido?
Sob o argumento da resolutividade propõe-se a substituição de um
trabalhador de nível fundamental por outro de nível fundamental na equipe
mínima que possui formação específica na área da saúde e a contratação
complementar de técnico de enfermagem ou ACS. Defendo que esta afirmativa
deveria se basear em algum estudo que comprove que o ACS não tem sido
resolutivo. Há algum estudo deste tipo elaborado pelo Ministério? O que
significa resolutividade no SUS e na Atenção Básica que queremos e que temos
lutado para construir desde a reforma sanitária? Por que o ACS não é
resolutivo? A resolutividade também não deveria estar ancorada nas ações que
vão para além dos procedimentos curativos, que se apoiam em promoção da saúde,
promoção de espaços de participação social e de protagonismo popular nos
serviços de saúde? A resolutividade dos problemas de saúde, também não
deveria estar ancorada em demais políticas sociais que extrapolam a saúde? Por
exemplo, como conter a dengue, Chikungunya, Zika e etc sem saneamento básico? Em
relação à resolutividade, voltada para os procedimentos biomédicos e demais
demandas, entendo que seria na formação técnica dos ACS que isto deveria ser
discutido, assim como é nessa formação que se fortalece as práticas de educação
popular em saúde e de participação social. Ao invés de se caminhar na
desprecarização de um trabalhador ofertando maior formação, a portaria investe
no retorno de um trabalhador precarizado em substituição a outro, sob o
argumento de resolutividade, quando na verdade, foi o suposto custo financeiro
que subsidiou a portaria.
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